A dublagem de jogos no Brasil vem crescendo ano após ano, com grandes e pequenas desenvolvedoras investindo cada vez mais em localização. Apesar de casos a parte como High On Life, A Plague Tale: Requiem e algumas empresas que ainda não entraram de cabeça nisso, hoje desfrutamos de muitas trabalhos de dublagens excelentes, inclusos em jogos como Atomic Heart e Ghostwire: Tokyo, que veremos em breve no Xbox.
E sabe o que a localização para o famoso PT-BR desses dois últimos jogos tem em comum? Ela foi feita pela mesma empresa! Estamos falando da Rockets Audio, que realiza a localização de jogos e produção de áudio para materiais didáticos.
Apesar de nova no mercado, completando seu primeiro ano de idade recentemente, a empresa já comandou a dublagem de alguns jogos, incluindo dois AAA nesses 12 meses: o FPS Sci-Fi ambientado na União Soviética e o jogo de ação desenvolvido pela Tango Gameworks.
Além disso, a equipe por trás da Rockets Audio já tem mais de 25 anos de experiência na área de comunicação e localização de jogos, contando com um portfólio de mais de 250 títulos, incluindo franquias first-parties e exclusivas do Xbox como Gears of War, Halo, Sunset Overdrive e Forza.
Com toda essa bagagem liderada por Carlos Cassemiro e Cristiano Prazeres, que tem um vasto histórico profissional na indústria nacional de games, fomos agraciados com a oportunidade de entrevistar toda a equipe da Rockets Audio, para discutir mais sobre a empresa e como anda a dublagem de videogames no Brasil.
CENTRAL XBOX (CX) – Como surgiu a oportunidade de trabalhar no mercado de Dublagem?
Rockets Audio (RA) – O Carlos entrou no segmento de games em 1997 através da Eletronic Arts. Lá, em operações, ele era responsável pela localização dos jogos que nessa época envolvia mais a localização de caixas e manuais. Em 1999 surgiu a oportunidade de começar a localizar o áudio dos primeiros FIFAs para PC.
Já Cristiano trabalha com áudio desde 1999, foi técnico de áudio em uma produtora onde ficou até 2011, quando abriu o Maximal Studio, e foi nesse momento que ele começou a investir na localização de games.
CX – Sobre o mercado nacional de dublagem na área de videogames, qual é o principal desafio para as produtoras brasileiras do setor nos dias de hoje?
RA – Quando abrimos a Rockets uma das nossas ideias era justamente dar suporte aos desenvolvedores brasileiros, tanto na produção de áudio para os jogos em português, quanto na localização ‘inversa’ dos jogos já disponíveis em português, dublando para o inglês (ou outras línguas) através de estúdios parceiros em outros países.
Muitos desenvolvedores, por não terem noção dos processos de produção de áudio e escolha de elenco, acabam fazendo a parte de voz do game de uma forma mais simples, com conhecidos, membros da equipe de desenvolvimento ou com atores aleatórios, sem uma produção adequada de casting e apta a oferecer uma produção com nível internacional, como nos melhores títulos lançados globalmente.
Neste ‘front’, nossa missão é dar suporte a estas empresas, oferecendo o know-how que temos na gestão da produção do áudio original junto às suas equipes, trabalhando com atores que se adequem aos personagens e, posteriormente, também fazendo a localização inversa para o inglês, para o jogo ser lançado mundialmente.
CX – Como funciona o pedido de dublagem nos games, afinal quem é o responsável por fazer isso acontecer?
RA – A própria desenvolvedora dos jogos normalmente tem um time de localização, onde tem um gerente de projetos responsável pela “dublagem” do jogo nas línguas que eles pretendem lançar. Normalmente esse gerente entra em contato com o estúdio de cada país e a partir desse momento começa o processo de pré-produção da dublagem.
CX – Quais são os maiores obstáculos para um estúdio entrar de vez na dublagem de games?
RA – O mercado hoje está muito aquecido na área de localização de games aqui no Brasil, temos estúdios fazendo ótimos trabalhos, mas também temos os aventureiros que muitas vezes acabam desistindo ao verem a complexidade de todo processo.
Há diversas dificuldades para se trabalhar com dublagem de games, mas ressaltamos uma delas que é a estrutura física e também de hardware, que demandam altos investimentos em tecnologia e equipamentos exigidos pelos desenvolvedores e necessários aos projetos em si.
Acrescentamos a isto a cibersegurança, preventiva ao vazamento de informações e manutenção do sigilo necessário a este tipo de projeto. São demandas extremamente complexas. Um estúdio que seja auditado e não cumpra com as exigências, nunca será homologado para trabalhar com os clientes nesta área.
CX – Quais os tipos de jogos que são mais difíceis de dublar?
RA – Não vemos dificuldade específica nos jogos, pelo menos não na nossa parte de gravação da dublagem. Acreditamos que a maior dificuldade seja a tradução de jogos de RPG com mundos de fantasia, esses sim são mais complexos por conta de glossários específicos, onde a tradução precisa seguir a risca todo o contexto do jogo.
Quanto a esses jogos especificamente, muitas vezes a produção de áudio pode ficar mais complexa por também exigir que mantenhamos a consistência de pronúncia de certas palavras e termos. Esta demanda gera um tempo de pré-produção maior, pois temos que criar “glossários falados” para os diretores usarem durante as gravações, garantindo a consistência nas pronúncias de certos nomes, palavras ou nomes de objetos durante toda a produção.
CX – Qual foi o título que vocês mais gostaram de ter trabalhado, seja pela liberdade criativa, ou por qualquer outro significado?
RA – Aqui pela Rockets, atualmente, sem dúvidas foi o Atomic Heart. Primeiro por termos trabalhado diretamente com os diretores criativos do jogo e também por podermos dar a “nossa” cara ao projeto. E o resultado ficou incrível, mesmo tendo trabalhado em cima de uma língua que nunca trabalhamos antes que foi o russo.
CX – Existe algum jogo que vocês gostariam muito de ter dublado, mas por algum motivo a dublagem não foi autorizada?
RA – Acho que todo mundo que trabalha com localização de games sonha um dia em dublar um GTA. Esse seria uma grande marco na dublagem de games… *risos*
CX – Quais os lançamentos futuros que vocês gostariam de dublar?
RA – Difícil dizer, existem tantos jogos que gostaríamos de poder trabalhar, mas como dissemos acima, quem sabe o GTA ou mesmo o Read Dead Redemption não sejam localizados um dia?
CX – Como foi escolher os dubladores para o Atomic Heart? Incluindo nomes de peso na dublagem brasileira de games como Raphael Rosatto (Ethan Winters – RE Village), Charles Dalla (Sub-Zero – MK) e Priscila Franco (Mia Whinters e Cassie Cage – RE Village e MK).
RA – Normalmente nos grandes jogos o desenvolvedor participa ativamente na escolha do elenco junto com o diretor de casting do estúdio. Dentro das informações que o cliente nos passa de cada personagem (voz original, biografia, ator original) acessamos nosso banco de vozes, escolhemos opções que de acordo com a experiência do Diretor se adequam mais a cada personagem e sugerimos ao cliente.
Para cada personagem são enviadas algumas amostras de vozes de 3 ou 4 atores, para o desenvolvedor/publisher escolher a que mais lhe agrada. E normalmente tentamos manter o mesmo timbre de voz do áudio original.
Eventualmente o cliente pode pedir que um ou mais atores gravem trechos específicos, com texto do jogo para sentirem se a escolha vai realmente funcionar para cada personagem.
Para o Atomic Heart não foi diferente, e acreditamos que a escolha foi muito certeira pois gostamos muito do resultado final do jogo, assim como os reviews especializados que ressaltam o diferencial do jogo localizado em PT-BR.
CX – A dublagem em jogos é um dos pedidos, e também um dos assuntos, que mais gera reclamações pelos gamers no Brasil. Como vocês enxergam essa demanda para que todos os títulos passem a ter dublagem?
RA – Ao longo dos últimos anos os desenvolvedores têm olhado cada vez mais para o mercado brasileiro e, do grande ao pequeno, muitos estão aderindo ao PT-BR justamente por conta do nosso mercado ser um dos que mais consome jogos no mundo.
Ainda tem alguns desenvolvedores que tem uma certa resistência e não lançam o jogo em outras línguas, apenas no inglês, mas isso também se deve ao orçamento do projeto que nem sempre comporta uma cota para a localização em outras línguas, mas nesse quesito, sempre que possível tentamos mostrar os ganhos e vantagens em localizar, que possivelmente atrai mais jogadores e leva mais satisfação para os que já consomem os jogos.
CX – E pra quem não conhece, como nasceu a Rockets Audio?
RA – Nós temos trabalhado juntos desde 2012, antes como fornecedor e cliente, e de 2016 a 2020 trabalhamos juntos em uma multinacional. Depois desse período cada um de nós, a seu tempo, começou a pensar em novos desafios e como dar um novo passo. Em 2020 o Carlos deixou a empresa e um ano depois o Cristiano seguiu o mesmo caminho, surgindo assim a oportunidade ideal para estruturação da Rockets como ela é hoje.
CX – Para finalizar, uma mensagem para a comunidade do XBOX, que é fascinada pela dublagem em jogos.
RA – Agradecemos DEMAIS a todos vocês pelo carinho e incentivo que muitos dão à dublagem nos games. Já trabalhamos em centenas de títulos ao longo dos anos, incluindo franquias como Gears of War, Halo, Sunset Overdrive, Forza, entre outras do mundo Xbox, e adoramos quando a resposta dos fãs é muito positiva com o resultado de um trabalho, isso só faz com que a gente se dedique cada vez mais a esse mercado de localização dos games.